segunda-feira, 17 de maio de 2010

Seleção do Dunga

Ao se fazer uma seleção de emprego, empregado, de casamento, do presidente da República ou dos jogadores que representarão o Brasil na Copa do Mundo, um bom selecionador não deve guiar somente por critérios técnicos. Ele deve sempre levá-los em consideração, tê-los como fatores decisivos quando a situação exigir, considerando-se os riscos e os prazos dos objetivos, mas jamais deve absolutizá-los.

Critérios técnicos devem ser pesados assim como outros critérios, a saber, comprometimento, confiança, personalidade e experiência. E nenhum desses critérios devem ser absolutizados, inclusive a coerência do selecionador. Numa seleção todo critério deve ser analisado em relação ao todo que se tem ou ao todo que se quer atingir. Nenhum critério deve ser analisado isoladamente. Digo isso porque entendo que para criticarmos ou elogiarmos devidamente o Dunga, por sua convocação, devemos compreender os seus critérios e sua lógica.

Dunga não é o técnico que eu gostaria que estivesse comandando a seleção. Quando o Parreira saiu torci para que o técnico fosse o Paulo Autuori. Também não me encanta a forma como a seleção joga. Mas não tenho nenhum problema em reconhecer os méritos do Dunga e que ele tem sido bem sucedido. Faturou a Copa América, a Copa das Confederações e as Eliminatórias. Nesta última se classificou há três rodadas do final. Em suma, sob o comando de Dunga, a seleção principal conquistou todos os títulos que disputou.

Dunga foi exitoso, também, em revalorizar o preço de uma convocação para a seleção brasileira, especialmente para os considerados “cadeiras cativas”, Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho e Roberto Carlos. Mostrou que uma convocação não pode ser barateada para ninguém, mesmo para os ex-astros. Quando vi o Roberto Carlos, que foi considerado o símbolo do descomprometimento na última Copa - lembra dele ajeitando a meia no escanteio que resultou no gol da França contra o Brasil -, falando com aparente entusiasmo que queria ser convocado para a Copa, cheguei à conclusão que Dunga conseguiu tornar a seleção desejável para quem aparentemente não a desejava mais, por se achar bem mais desejável do que ela.

É lógico que essas conquistas pouco ou nada servirão de atenuantes se o Brasil fracassar na Copa. Pelo contrário, todas elas serão desvalorizadas. A era Lazaroni na seleção não é lembrada pela conquista da Copa América depois de 40 anos de jejum, mas pelo fiasco na Copa de 1990. A terceira passagem de Parreira na seleção não é lembrada pelas também conquistas da Copa América, Copa das Confederações e as Eliminatórias. Mesmo a memória do futebol exuberante apresentado na semifinal e na final da Copa das Confederações na Alemanha, em 1995, contra a anfitriã (3x2) e a Argentina (4x1), respectivamente, que despontou o autêntico “quadrado mágico”, formado Kaká, Ronaldinho Gaúcho, Adriano e Robinho, não aquele formado na Copa – lembre-se que a dupla de ataque foi formada por Ronaldo e Adriano –, sofreu obnubilação pelo fracasso ocorrido no ano seguinte, na Copa.

É bem verdade que na ocasião, Parreira, ao contrário de Dunga, modificou o time que tinha encantado em 2005 na Alemanha. Não só no ataque, mas também nas laterais. Cicinho e Gilberto, titulares na conquista da Copa das Confederações, foram para a reserva de Cafu e Roberto Carlos, respectivamente. Na época, Cicinho, estava no auge de sua carreira. Curiosamente no melhor jogo do Brasil naquela Copa, contra o Japão (4x1), eles foram titulares.

Dunga, a princípio, manterá nas “quatro linhas” o time que o tem garantido até aqui, com uma ou outra alteração. Acredita nos jogadores que convocou e aposta nas recuperações daqueles que estão freqüentemente na reserva em seus clubes como, Doni, Julio Baptista, Felipe Mello e Kléberson. Tem convicção do que faz. Porém, é preciso ele ter consciência que a convicção é fundamental para acertar, mas ela não é garantia contra o erro. A gente erra sem e com convicção.

Entendo que Dunga deve, sim, ser grato aos jogadores que nos pontos críticos de sua jornada, quando seu cargo este por um fio, reverteram o quadro desfavorável, especialmente Robinho, Julio Baptista e Luís Fabiano, mais do que Kaká. Deve, sim, considerar a estabilidade do grupo. Mas deve, também, entender que a seleção não é propriedade sua, que ele é um funcionário que precisa mostrar resultados e seu objetivo maior é a conquista da Copa do Mundo. Se a Copa não vier, a estabilidade se converterá em instabilidade. A mútua gratidão se converterá em mútuas cobranças e mágoas. Ninguém se engane disso.

Para mim os jogadores que Dunga convocou têm condições e potenciais para conquistar o hexacampeonato para o Brasil. Se a equipe mantiver o seu estilo de jogo é a grande favorita. Se apostasse, apostaria a maior parte dos recursos nela. Todavia, entendo que Dunga poderia diminuir os riscos inevitáveis de fracasso, inclusive parte de sua responsabilidade por sua eventual ocorrência, se revisse algumas convocações e se acreditasse mais no rico potencial que já se converte em trabalho primoroso do que temesse a inexperiência. Poderia dosar melhor seus critérios.

Por exemplo, que não levasse Neymar, mas levasse Paulo Henrique Ganso. Ganso é uma espécie que parecia ter sido extinta. Um meia que lê o jogo, arma, lança e avança ao ataque. É mais do que um armador e mais do que um meia-atacante. Tem qualidades que o Kaká não tem. E já deu provas de maturidade. Nas finais do Paulista foi o ponto de desequilíbrio e de equilíbrio do Santos. De desequilíbrio ao marcar e dar assistência para gols. E de equilíbrio no último jogo da final, quando o Santos perdia o jogo e estava com um e depois com dois jogadores a menos que o Santo André, que dependia de apenas mais um gol para se sagrar campeão. Ganso cadenciou o jogo e prendeu a bola no ataque garantindo o título santista.

Se Kaká, o único jogador criativo do meio-de-campo se contundir quem irá criar? Se o Brasil estiver atrás no placar, precisando atacar, que mais do que ele tem potencial do que ele para desequilibrar ou dar uma assistência. O Brasil na era Dunga teve muitas dificuldades quando precisou tomar iniciativa. Lembremo-nos dos empates em casa contra a Argentina, Bolívia e Venezuela. A equipe se saiu melhor quando jogou no contra-ataque, esperando a iniciativa do adversário.

Convocaria um goleiro experiente para a reserva de Julio César. Numa eventual contusão dele, Gomes e Doni, reserva de Julio Sérgio na Roma, não me inspiram confiança. Se o Rogério Ceni estivesse disposto a ir a mais uma Copa como reserva seria meu escolhido. No lugar de Thiago Silva levaria Miranda e no de Luisão, levaria seu irmão, Alex Silva. Discordo dos dois laterais-esquerdo. Levaria André Santos, que se saiu bem na Copa das Confederações, e Marcelo no lugar de Gilberto e Michel Bastos, que joga na ala direita e meia no Lyon. Aliás, tenho curiosidade em saber por que Dunga não os convocou mais. Levaria também o Hernandes. Embora quando convocado, especialmente nas Olimpíadas, não tenha correspondido à grande expectativa que gerou, e mesmo no São Paulo já tenha atuado melhor é um jogador que já comprovou ter uma qualidade acima da média É um volante que marca e sai com desenvoltura para o jogo, ajudando na armação, é habilidoso, tem um bom passe, chuta bem de fora da área e tem boa mobilidade. Qualidades juntas que nenhum volante da seleção tem. Apostaria nele porque acho é demais na seleção Gilberto Silva, Josué Felipe Mello e Kléberson juntos. Levaria Hernanes e Ganso no lugar dos dois últimos.

Também acho demais Julio Baptista, Ramires e Elano juntos. Muita gente pela direita. Levaria Ronaldinho Gaúcho, embora ele esteja longe de ser o astro que um dia já foi. Jogando o que tem jogado está acima desses. É um jogador que eventualmente ainda manifesta lances de gênio. Num jogo truncado seria uma alternativa ainda com um alto potencial de desequilíbrio, uma individualidade a se sobressair. Levaria ele no lugar do Ramires.

Concordo com Dunga em não levar o Ronaldo nem o Roberto Carlos. Se o objetivo é renovar a seleção não faz sentido levá-los. Também concordo em não levar o Adriano. Além dos constantes atos de indisciplina e de falta de comprometimento no Flamengo, sua fase técnica não é boa. Somado a isso tem a memória da última Copa quando foi um fiasco.

Enfim, ganhar ou perder faz parte do jogo. O Brasil já ganhou e perdeu jogando bonito e feio, mas nunca ganhou jogando mal. Uma coisa é perder ciente de que escolheu e fez o melhor que tinha e podia. Outra bem diferente é perder e tomar consciência de não ter usufruído o melhor que tinha e podia. Espero que Dunga esteja ciente de que escolheu o melhor para vencer.

Nenhum comentário: