sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

Constrangidos pela graça

Em minha tenra carreira cristã tenho ouvido muitos cristãos dizerem implícita e explicitamente que não gostam que os pastores preguem muito, sobre o amor incondicional de Deus, a remissão completa dos pecados em Jesus Cristo e a salvação exclusivamente pela graça, independentemente das obras. Alegam que essa mensagem proclamada a exaustão desestimula a prática da santidade, o serviço cristão; torná-os crentes relapsos, descompromissados com o evangelho; e serve de álibi para àqueles que posam de cristão, mas gostam de cair na folia, na gandaia, na boêmia. “Afinal Deus me ama incondicionalmente, perdoa todos os meus pecados e me salva por sua graça, porque sabe que sou pecador por natureza, incapaz de viver conforme sua vontade por esforço próprio. Aliás, Ele mesmo experimentou as fraquezas, as tentações humanas, quando habitou entre nós na pessoa de seu filho Jesus Cristo; por isso sabe que ‘ser humano’ é algo deveras complicado”.

Dizem preferir àquelas “pregações apocalípticas” que põem o “dedo na ferida”, atacam o pecado e o miserável pecador, deixando a sua alma tenebrosa, atemorizada com um possível destino infernal caso não abandone sua vida ímpia. Acreditam ser mais eficazes no controle do comportamento dos cristãos.

Preocupações como essas são típicas de uma consciência religiosa condicionada por uma moralidade linear, de causa e efeito, embebecida de justiça própria e que, por isso, não consegue apreender ou aceitar o “escândalo da graça”. E não conseguem porque a graça é por natureza assistemática, não se confina em categorias teológicas - para desespero dos teólogos ortodoxos -, é livre e subversiva manifestação do amor de Deus derramado pelo Espírito Santo no coração de sua humanidade.

É preciso mencionar também àqueles cujas preocupações são de natureza imoral. Temem que a Palavra da graça emancipe a consciência dos cristãos dos grilhões da religião, da tutela do clero, da (i) moralidade eclesiástica. Ficam amedrontados com a possibilidade da paz de Cristo passar a ser o árbitro do coração dos cristãos (Colossenses 3.15) e não mais a “cúpula espiritual” da Igreja (?).

Àqueles que compreenderam a graça não temem sua proclamação efusiva porque sabem que ela é expressão da única força persuasiva eficaz para a conversão, a transformação da atitude – disposição interior, modo de perceber e encarar a vida - que produz salvação, a saber: o amor de Cristo. O amor que nos constrange a seguí-lo (II Coríntios 5.14). Sabem também que a Palavra de Deus não diz que onde o pecado superabunda abundou a graça, mas que a graça superabunda onde o pecado abundou (Romanos 5.20).

Não é o medo do inferno que rende o pecador a Cristo. O medo é eficaz para escravizar a consciência ao poder das trevas e de nossas sombras; pode até instalar um comportamento ascético, religioso, que aparenta ao público “consagração”, “devoção”, “zelo espiritual” por um longo período, todavia é totalmente ineficaz contra nossa atitude pecaminosa (Colossenses 2.20-23). Como é a atitude que predispõe o comportamento, este não consegue refreá-la por muito tempo e muito menos transformá-la por sim mesmo. Freqüentemente ele é traído em suas “boas intenções”.

Não se propõe a supressão da denúncia do pecado, pelo contrário o convite ao arrependimento para a salvação já o pressupõe; mas que o pregado não seja proclamado sem o anúncio do amor, da graça e do perdão de Deus em Jesus Cristo.

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